No início da década de 1990, um programa de televisão num canal estatal permitiu a um arquitecto português ensaiar, debater e partilhar, a cores e em estéreo, os fundamentos do conhecimento arquitectónico com uma audiência alargada. Na qualidade de autor e de apresentador da secção de arquitectura do magazine cultural Ver Artes, Manuel Graça Dias transformou uma transmissão televisiva de divulgação da arquitectura portuguesa contemporânea num exercício panorâmico de confrontação e questionamento sobre ela mesma. Ao longo dos seus 83 episódios, Manuel Graça Dias entrevistou protagonistas, antagonistas e figuras marginais; deambulou por grandes equipamentos públicos, discretas moradias e pequeníssimas intervenções; deu a conhecer a história do urbanismo de Lisboa, de pedaços de cidade planeados de raiz e de aglomerados clandestinos; teve ainda espaço para desenvolver temas que, não sendo do campo estrito da arquitectura, estimulavam a sua interpretação. A hipótese que a presente dissertação pretende colocar é a de que este programa de televisão funcionou como um campo de ensaio, em tempo real e colectivamente partilhado, de uma espécie de refundação do debate arquitectónico em Portugal, em tempos desafiantes e algo paradoxais, em que a arquitectura portuguesa tanto começava a suscitar grande interesse popular, quanto padecia ainda de uma generalizada incompreensão e desconhecimento. O lugar produtivo que um programa de televisão — ou, para esse efeito, qualquer outro suporte fílmico — ocupa no campo da cultura arquitectónica portuguesa, e qual a especificidade da sua contribuição, é a questão a que por fim a presente investigação se propõe perseguir.

In the beginning of the 1990s, a television broadcast in a public channel enabled a portuguese architect to rehearse, discuss and share, in color and in stereo, the fundamentals of the architectonic knowledge with a broader audience. In the capacity of author and host in the architecture’s section of the cultural magazine Ver Artes, Manuel Graça Dias transformed a televised transmission about contemporary Portuguese architecture into a panoramic exercise of confrontation and questioning about itself. Throughout the 83 episodes, Manuel Graça Dias interviewed protagonists, antagonists and marginal figures; wandered through big public buildings, discreet houses and subtle interventions; talked about Lisbon’s urban history, parts of cities planned from scratch and clandestine neighbourhoods; there was even space to dwell on subjects which, despite not being directly related with architecture, stimulated its interpretation. The hypothesis launched by the present dissertation is that this television broadcast provided a field test, in real time and collectively shared, for a kind of refoundation of the architectonic debate in Portugal, in challenging and somewhat paradoxical times, when architecture was both raising popular interest, as was also largely misunderstood and unacknowledged. The productive place that a television broadcast — or, for that matter, any other king of filmic media — occupies in the realm of the Portuguese architectonic culture, and what is the specificity of its contribution, is the question that this research ultimately intends to pursue.