Vice-Reitor Investigação e Modernização Tecnológica
Investigador IT
Docente Iscte
Investigador IT
O projeto MARES tem a ver com o rastreamento de plástico nos oceanos através de micro-ondas. Pode contextualizar?
O lixo marinho foi considerado por organizações internacionais, incluindo as Nações Unidas, como um dos principais problemas globais a ser tratado neste século. Durante os últimos 50 anos, o plástico tem crescido até se tornar 60% - 80% de toda a poluição marinha, a nível mundial. Uma vasta gama de tipos e tamanhos de objetos sintéticos duráveis, flutuantes e submersos, estão a afetar, cada vez mais, o ecossistema marinho, com consequências para a cadeia alimentar humana a curto prazo. Estudos também apontam que a degradação dos plásticos nos oceanos pode ter implicações indiretas nas alterações climáticas. Existem evidências que sugerem que os microplásticos (detritos com dimensão inferior a 5 mm) podem também degradar a capacidade do plâncton para remover dióxido de carbono da atmosfera.
A identificação das rotas de migração dos detritos marinhos e dos seus pontos de acumulação é o primeiro passo para evitar que os plásticos possam entrar nos ecossistemas oceânicos. Os satélites proporcionam o alcance geográfico necessário para enfrentar este problema global. No entanto, não existe, até à data, conhecimento sobre quais as melhores tecnologias para a deteção e monitorização do lixo marinho.
Devido à limitação de cada tecnologia de deteção remota, acredita-se que a melhor possibilidade de deteção vem da combinação de informação de diferentes sensores. Uma das principais tendências para a deteção remota de acumulação de lixo marinho é atualmente baseada em instrumentos óticos. Por outro lado, a deteção de plástico utilizando micro-ondas, apesar de ser uma tecnologia já usada em várias missões de satélite de observação terrestre e marítima, ainda está na sua infância. O objetivo do projeto é, assim, fornecer evidências da deteção de lixo marinho utilizando técnicas de deteção remota por micro-ondas. Este conhecimento abre o caminho para a utilização mais eficiente da atual infraestrutura de satélites instalada e fomentar novas missões especificamente concebidas para a deteção de plástico.
Este projeto surgiu como?
O projeto surge em resposta a um desafio da Agência Espacial Europeia – ESA, através do programa “The Open Space Innovation Platform (OSIP)”. Foi formada uma equipa multidisciplinar, que agrega investigadores de várias universidades portuguesas conectados através dos correspondentes pólos de investigação do Instituto de Telecomunicações (IT). Com base na experiência da equipa e testes preliminares feitos nos nossos laboratórios foi possível elaborar uma proposta credível, que acabou por ser aceite pela ESA.
Porquê a utilização das micro-ondas?
A deteção remota com base nas micro-ondas é uma tecnologia já madura utilizada em várias missões de satélite de observação terrestre e marítima. Estes sistemas permitem uma monitorização contínua, independentemente das condições meteorológicas ou de iluminação.
O objetivo é explorar esta banda de frequências para obter informação complementar sobre a resposta do plástico nos oceanos não acessível a outro tipo de sensores. As micro-ondas também têm o potencial de resolver algumas das limitações da deteção de plásticos direta, através de imagens no domínio quase-ótico. Uma destas prende-se com os microrganismos marinhos, como algas e plantas, que se fixam e crescem gradualmente nos plásticos (biofouling), podendo alterar significativamente a sua assinatura ótica. Outra limitação dos sensores óticos tem a ver com o processamento necessário para mapear grandes zonas do oceano, o que limita a escalabilidade desta abordagem.
As micro-ondas têm o potencial de permitir deteção sem necessitar de uma resolução tão fina. Assim, as micro-ondas podem ser utilizadas para ter uma rápida identificação de grandes áreas onde é provável encontrar lixo marinho, para depois serem minuciosamente analisadas com a alta resolução dos sistemas óticos.
O desafio que nos foi lançado foi no sentido de usar um espetro de frequências menos explorado para a deteção de plásticos nos oceanos: as micro-ondas. Estas têm uma maior imunidade às condições atmosféricas quando comparadas com soluções baseadas em sensores óticos.
Por outro lado, a utilização de frequências mais baixas implica uma menor resolução o que requer um processamento específico para conseguir extrair o sinal útil correspondendo a uma deteção. O foco deste trabalho é provar a viabilidade destas técnicas, que se espera possam complementar as tecnologias existentes e contribuir para a resolução deste problema premente da sociedade moderna.
VISTA DAS INSTALAÇÕES em Deltares onde foram feitas medidas
Em que fase está o projeto de investigação?
Neste momento estamos a meio do projeto, que tem duração de 18 meses. Estamos a acabar a primeira fase focada em medidas indoor. O objetivo, até aqui, tem sido em medir o sinal de micro--ondas em ambientes controlados para identificar os principais mecanismos físicos envolvidos e isolar as condições ideais para deteção. Foram realizadas várias campanhas de medida que exploram diferentes cenários (água estática, ondulação controlada), tipos de alvos (garrafas de plásticos, redes, palhinhas, lixo indiferenciado recolhido nas praias, entre outros) e técnicas de micro-ondas (passivas baseadas em radiómetros e ativas baseadas em RADAR).
As medidas têm sido feitas em diferentes locais, nomeadamente em piscinas dedicadas, montadas nos laboratórios do IST e do Politécnico de Leiria. A equipa também integrou uma campanha de medida realizada na Holanda, nas instalações de Deltares, o que permitiu testar a deteção de plástico utilizando um sistema de RADAR, com ondulações controladas representativas das condições de alto mar.
O próximo passo do projeto será avançar para medidas em ambientes exteriores que permitam validar as técnicas desenvolvidas com base em condições não controladas e, portanto, mais próximas de um sistema real.
LIXO RECOLHIDO das praias e medidas de teste em água estática.
Quais as principais conclusões preliminares que já obtiveram?
A primeira grande conclusão deste estudo, até agora, é que os macro plásticos (objetos com dimensão > 25 mm) que flutuam na água induzem uma resposta detetável por sistemas de RADAR, em várias condições de ondulação, representativas de alto mar. Este é um resultado fundamental para o nosso estudo de viabilidade, sem o qual não faria sentido avançar para situações de ambiente não controlado.
Quem forma a equipa do projeto MARES?
A equipa é constituída por sete professores investigadores do Instituto de Telecomunicações e dois alunos de doutoramento de várias universidades nacionais (Instituto Superior Técnico (IST), Iscte – Instituto Universitário de Lisboa, Instituto Superior de Engenharia de Lisboa (ISEL), Politécnico de Leiria, Escola Naval). A coordenação de projeto é de Carlos Fernandes, do IST, coadjuvado por Sérgio Matos do Iscte – Instituto Universitário de Lisboa.