SUSTENTABILIDADE

Universidades em diálogo para sociedades inclusivas e resilientes




CATARINA FERREIRA DA SILVA

Professora  Iscte Tecnologias e Arquitetura

Diretora e Investigadora ISTAR-Iscte


MARIA DAS DORES GUERREIRO

Vice-Reitora  Internacionalização

Investigadora CIES‑Iscte



Ligando em rede universidades da Europa, o projeto InCITIES Trailblazing Inclusive, Sustainable and Resilient Cities, que o Iscte lidera, procura potenciar a capacidade de ensino, investigação e disseminação, em prol de cidades mais sustentáveis e universidades mais fortes. Pretende também que as organizações do ecossistema trabalhem muito estreitamente com a academia para resolver problemas concretos




Em que consiste o InCITIES?

Maria das Dores Guerreiro (MDG) Este projeto tem características peculiares. É institucional e abarca todas as atividades do Iscte, indo além do que é habitual num projeto de investigação. Inscreve- -se na estratégia de internacionalização do Iscte, cobrindo as suas várias atividades, tendo uma componente muito forte na valorização e desenvolvimento da investigação, dos nossos programas de ensino e na inovação, para que possamos contribuir para o aprofundamento de dinâmicas com o ecossistema. Procura também promover a melhoria dos processos de funcionamento internos, designadamente a nível administrativo e de gestão dos nossos vários serviços. Envolve desde a área dos recursos humanos, para a gestão das pessoas e gestão das carreiras, aos serviços de gestão do ensino e de apoio às unidades de investigação, mas também os serviços de relações internacionais para o intercâmbio de estudantes, professores e staff técnico e administrativo.
O projeto foi estruturado para que produza transformações institucionais em sintonia com padrões europeus e com o que virão a ser as universidades do futuro, em ligação mais estreita com a sociedade – universidades a trabalhar em rede.

 

O projeto envolve também universidades de outros países?

MDG O projeto enquadra-se no âmbito da Aliança Pioneer, mediante a qual nos candidatámos à Iniciativa Universidades Europeias. Começámos o consórcio no final de 2019, a candidatura do projeto InCITIES foi apresentada em 2021 e o projeto arrancou em 2022. Estão envolvidas cinco universidades da Aliança Pioneer: além do Iscte, a Technische Hochschule Köln (Alemanha), Laurea- Ammattikorkeakoulu (Finlândia), Université Gustave Eiffel (França) e Zilinska Univerzita V Ziline (Eslováquia).
O financiamento do InCITIES provém do programa Horizon Europe WIDERA (Widening Participation and Spreading Excellence), na área de intervenção European Excellence Initiative, dirigido aos países do alargamento, onde Portugal se insere juntamente com a Eslováquia. Foi desenhado com objetivos análogos aos que se pretendem alcançar na Aliança Pioneer em termos de programas conjuntos de ensino e pesquisa, permitindo que os nossos estudantes, docentes, investigadores e pessoal técnico e administrativo circule entre as universidades do consórcio.

 

Que outros aspetos importantes destacam neste projeto?

Catarina Ferreira da Silva (CFS) O projeto abarca todas as vertentes de uma universidade, quer o ensino, quer a investigação, quer o relacionamento com o resto da sociedade, por exemplo, a transferência da tecnologia e do conhecimento com o chamado ecossistema.
Neste projeto, os parceiros do ecossistema têm vários perfis, desde organizações não governamentais (ONG), entidades públicas e empresas. Temos uma empresa da área da informática, a Área Metropolitana de Lisboa, a CP, algumas ONG como a Inovar Autismo, a Confederação Portuguesa de Coletividades de Cultura e Recreio ou a Confederação Portuguesa de Voluntariado. Há duas organizações finlandesas, outras da Eslováquia, e temos também, fora da Europa, a Universidade de Sherbrooke, no Canadá, como parceiro associado.

MDG A filosofia das universidades europeias e da sua ligação ao ecossistema impele-nos a ir além da disseminação: queremos que as organizações parceiras associadas do projeto colaborem connosco, tragam os seus problemas para os alunos estudarem e resolverem na sala de aula. Procura-se que transmitam aos estudantes conhecimento do seu métier que seja importante para o que está a ser lecionado. Permite que os estudantes tomem contacto com os desafios e processos que o ecossistema enfrenta, preparando-os melhor para o mercado de trabalho.

CFS Há empresas que nos procuram para chegar aos estudantes de Informática e Sistemas de Informação. Pedem para vir à sala de aula explicar o que fazem e que competências procuram. Sempre lecionei aliando conceitos teóricos a uma forte componente prática. A forma como ensino também se aproxima da metodologia ‘aprender-desenvolvendo’ (learning by developing) proposta neste projeto: é apresentado um desafio aos estudantes e estes devem trabalhar o mais próximo possível dos processos do mundo profissional extra académico. Se uma empresa expõe uma necessidade, os estudantes devem tentar resolver esse desafio, não de forma simulada, mas concreta e prática.


Nas ciências sociais esta metodologia também é aplicável?

MDG Em alguns domínios aplica-se de forma clara. As ciências sociais têm como preocupação estudar as relações sociais e a sociedade, identificando problemas e potenciais soluções. O projeto InCITIES Trailblazing Inclusive, Sustainable and Resilient Cities tem foco nas cidades e nelas temos a infraestrutura física e temos as pessoas. Na componente da inclusão, por exemplo, aborda os problemas dos residentes nas cidades, as características dessas populações onde há mais ou menos vulnerabilidades e às quais as ciências sociais estão particularmente atentas, procurando encontrar respostas para informar políticas públicas.
Este é um projeto transversal pois, do ponto de vista institucional, abarca vários serviços e missões da universidade – ensino, investigação, extensão e internacionalização.
Há investigadores do Iscte de diferentes áreas envolvidos no projeto, nomeadamente da sociologia, da economia, das tecnologias digitais, da engenharia informática, dos sistemas de informação, dos métodos de investigação, da análise de dados, da arquitetura, etc.
Esperamos que o projeto contribua para pensar as cidades do futuro, para encontrar soluções e resolver problemas, com forte componente de inovação.

Com a diversidade de pessoas e competências envolvidas, este é um projeto mais complexo de gerir?

MDG Existe alguma complexidade. Contudo, dado ser uma tipologia de projeto de Coordenação e Ação de Suporte, que envolve várias vertentes da universidade, a organização dos work packages do projeto permite-nos articular várias áreas e pessoas.
Nós as duas temos um diálogo permanente. Na estruturação deste projeto e dos diferentes work packages identificaram-se pessoas que têm contribuído para vários domínios.

 


Queremos que as organizações parceiras associadas do projeto colaborem connosco, tragam os seus problemas para os alunos estudarem e resolverem na sala de aula



Quais são os grandes temas identificados para o InCITIES?

CFS São sete as temáticas hub, como ponto de partida para a investigação, na qual se pretende construir um road map (mapa de trabalho de colaborações) e criar workhops, no contexto do projeto, para fomentar o diálogo entre os investigadores das cinco universidades beneficiárias do financiamento. Os sete hub são os seguintes: 1) Questionar as transições urbanas; 2) Natureza na cidade; 3) Energia na cidade; 4) Vulnerabilidade, inclusão e saúde na cidade; 5) Mobilidade; 6) Transição digital; e 7) Cidades sustentáveis e resilientes Neste processo foram criados os Scientific Cafés, online, em que os investigadores apresentam os seus tópicos de trabalho e interesses científicos e interagem com os colegas das universidades parceiras. Isto serve para se conhecerem, para verem pontos de confluência e continuidade e mesmo para lançar novas temáticas de projetos e outros tipos de colaboração. Gera-se um diálogo e uma partilha que a todos enriquece. O segundo InCITIES Scientific Café realizou-se em março 2024 com o tópico da Mobilidade e o terceiro em abril, sobre o tema da Energia.

 

Quais são as áreas de saber predominantes na escolha dos estudantes dos PALOP em Portugal?

MDG Foi desta parceria com as universidades envolvidas no InCITIES que nasceu o mestrado europeu que está a ser desenvolvido na Escola de Sintra: ManagiDiTH – Master of Managing Digital Transformation in the Health Sector (Mestrado de Gestão da Transformação Digital no Setor da Saúde). Foi criado com duas outras universidades parceiras – a Gustavo Eiffel e a Laurea – e nasceu para pormos em contacto colegas de várias universidades e áreas do saber, fomentando-se o interconhecimento e explorando possibilidades de colaboração. Num mestrado deste tipo há um caminho a percorrer para a homologação do novo produto de ensino, incluindo a aprovação dos programas, em três países diferentes. Temos de ter sempre também a aprovação da A3ES.

 

Podem detalhar os work packages com que o projeto InCITIES se comprometeu?

MDG Os work packages e os países que os têm a cargo são: 1. Gestão (Iscte Portugal)
2. Investigação (Université Eiffel França)
3. Gestão de carreiras de investigação/HRS4R (TH Köln Alemanha)
4. Planos de Igualdade, Diversidade e Inclusão (LAUREA Finlândia)
5. Fatores que facilitam a colaboração dos parceiros InCITIES (Iscte Portugal)
6. Metodologias Pedagógicas de Ensino-Aprendizagem/ learning by developing testado em programas intensivos de intercâmbio entre universidades (UNIZA Eslováquia)
7. Comunicação, Disseminação e Exploração – Capitalizar os resultados do projeto para o futuro (UNIZA Eslováquia)


Esperamos que o projeto contribua para pensar as cidades do futuro, para encontrar soluções e resolver problemas, com forte componente de inovação


Quando o projeto terminar em 2025, que evidências vão perdurar?

CFS Um dos objetivos da Comissão Europeia, no espírito da Europa Digital, é podermos ter processos desmaterializados e acordos de parceria mais fáceis, mesmo para novos mestrados e doutoramentos. A Universidade deve estudar, propor recomendações e potenciais soluções aos decisores políticos.
Há também uma grande aposta no learning by developing para tentar que os estudantes trabalhem sobre desafios e necessidades do ecossistema.

MDG No final, como referimos, este é um projeto institucional que se quer em consonância com a Iniciativa Universidades Europeias. Teremos resultados específicos de cada work package, dentro do espírito das guidelines definidas. Por exemplo, ao nível do HRS4R (Human Resources Strategy for Researchers), fazer o caminho necessário para obter esta acreditação será um output; outro output será termos um Plano de Igualdade, Diversidade e Inclusão atualizado.
O InCITIES que nasceu, como referi, do envolvimento das cinco universidades iniciais da Aliança Pioneer, também alimenta as práticas de interesse da Aliança Pioneer.

CFS Em termos de investigação, um objetivo é ter um observatório de recolha, de análise e de visualização de dados sobre as cidades envolvidas no projeto. Através desse observatório passaríamos a monitorizar vários indicadores relativos à sustentabilidade, inclusão e resiliência, que se traduzem, por exemplo, em análise de dados sobre os picos de calor, os espaços verdes, cheias, transportes, etc., que em parte são recolhidos com recurso a tecnologias dos sensores. Projetamos também recolher e agrupar dados estatísticos das cidades, que podem ser transformados em problemas de investigação e de ensino.

 

Voltar ao topo