FORMAÇÃO

A formação no epicentro das empresas sustentáveis




FLORINDA MATOS

Professora  Iscte Business School

Investigadora Dinâmia’CET-Iscte



O projeto CATALYST quer criar um Centro de Excelência Profissional partilhado por cinco países, com a oferta educativa de 70 cursos online, para apoiar micro, pequenas e médias empresas europeias. O projeto aborda a sustentabilidade organizacional, social e económica, interligando universidades e empresas




O que se pretende com este projeto, que se foca na educação e formação profissional?

O CATALYST visa qualificar as entidades do sistema empresarial, particularmente as PME, que são as mais deficitárias em termos de qualificações para uma economia verde e digital, e também contribuir para a melhoria das políticas públicas que estão ligadas à transição verde. Pretende-se fazer uma ligação entre o sistema de qualificação tradicional, o sistema de ensino e as políticas públicas, porque, muitas vezes, essa ligação é inexistente. O Ensino e a Formação Profissionais (EFP) são fundamentais para uma mudança sistémica e a longo prazo das economias europeias, de forma a terem maior sustentabilidade e resiliência. São também necessárias novas competências para aproveitar as oportunidades decorrentes da transição digital sustentável. Por isso, o nosso foco é preparar as PME e o seu capital humano para os desafios e mudanças nos modelos de negócio ligados à sustentabilidade. As PME são responsáveis por mais de 60% do emprego na Europa e a maior parte da inovação vem delas, contrariamente aquilo que se pensa. Em Portugal, e noutros países, constituem aproximadamente 98% das empresas. Mas as PME são também as empresas mais fragilizadas, porque lhes faltam recursos financeiros, capacidade de gestão e qualificação do seu capital humano.

 

No CATALYST estão envolvidos muitos parceiros. Como se está a concretizar em Portugal?

O projeto em Portugal envolve três parceiros: o Iscte, que é o coordenador nacional; a ICAA – Associação para a Gestão do Capital Intelectual e o CENTIMFE – Centro da Indústria Tecnológica dos Moldes e Plásticos. O projeto está muito alavancado no conhecimento e na gestão do capital intelectual.
Toda a candidatura foi feita com base na ideia de que ao gerir melhor os recursos intangíveis das organizações, estas estarão mais bem preparadas para alcançar os desafios da sustentabilidade e também da transição digital.
O CENTIMFE por sua vez, que trabalha num cluster muito estratégico da nossa economia, em que a maior parte da produção é para a exportação. Exige tecnologia de ponta que cumpre com muitos padrões de sustentabilidade. As empresas com apoio do CENTIMFE produzem para o setor automóvel, altamente exigente nos critérios de sustentabilidade, não apenas em termos ambientais, mas também em termos sociais. São empresas muito competitivas.
Em síntese, há três entidades a trabalhar conjuntamente para um objetivo comum, numa excelente parceria.

 

Essas três entidades parceiras até onde pretendem chegar?

O CATALYST é um ponto de partida mas o ponto de chegada será criar uma estrutura: o CoVE – Centre of Vocational Excellence (Centro de Excelência Profissional).
Em Portugal, os três parceiros já lançaram essa estrutura e chamámos-lhe Fábrica de Competências do Futuro (Future Skills Factory). Depois de o projeto terminar, o objetivo é trazer outros parceiros que nos possam ajudar a identificar quais são as competências que as empresas vão precisar futuramente. Pretendemos deixar algo que possa funcionar como uma espécie de “observatório”, que identifique o que é preciso para que a formação profissional tenha efeitos reais. Passamos por diversos Quadros Comunitários e, apesar de se aplicar muito dinheiro, muitas vezes não há resultados.
Queremos melhorar isso, antecipando o que as empresas devem fazer, como devem fazer, quais as melhores práticas e, sendo possível, influenciar as políticas públicas no sentido de alavancar este processo. A Fábrica de Competências do Futuro está a utilizar o projeto CATALYST para dar os primeiros passos, mas tem o objetivo de continuar depois do projeto, com autonomia.


O ensino e a formação profissionais são fundamentais para uma mudança sistémica e a longo prazo das economias europeias, de forma a terem maior sustentabilidade e resiliência




Um projeto trans-educacional

5 + 1
países

16
parceiros

Os parceiros envolvidos no projeto CATALYST são três entidades de cada um dos seguintes países: Macedónia do Norte, Alemanha, Áustria, Portugal e Grécia, além da francesa SDSN. O projeto poderá ainda aceitar novos parceiros, que irão usufruir destes cursos e com os quais poderá posteriormente haver projetos conjuntos. Trabalhar com todos estes parceiros, em prol da qualificação das empresas da Europa, é um grande desafio. Mas o maior de todos será realmente construir uma Fábrica de Competências do Futuro, capaz de responder aos desafios que o futuro nos coloca.
Florinda Matos


Além de entidades ligadas ao Iscte há também interesse da parte de entidades públicas?

Contamos com entidades do Iscte – as participadas IPPS e Audax e a Escola de Tecnologias Aplicadas – Iscte-Sintra – e, em fevereiro, conseguimos também juntar outros parceiros, como o IAPMEI.
Apesar do projeto estar muito focado na sustentabilidade, não se pode falar disso sem transformação digital. Há outras entidades que gostaríamos de envolver no projeto, como o IEFP (Instituto do Emprego e Formação Profissional), até porque muitos dos cursos oferecidos pelos centros de formação profissional não respondem às necessidades identificadas pelo mundo empresarial.

Que outros outputs são expetáveis no projeto?

O CATALYST vai produzir 70 cursos de formação profissional em competências que têm a ver com sustentabilidade, transformação digital e capital intelectual. Acreditamos que se conseguirmos equilibrar estes três elementos nas empresas, estas serão mais produtivas, competitivas e sustentáveis. No caso do Iscte, estamos a preparar oito cursos, com matérias como Gestão do Conhecimento e Inovação, Transformação Digital e Sustentabilidade, etc. O CENTIMFE terá cursos na área da economia circular e, no caso da ICAA, na área do capital intelectual. Os outros países envolvidos – Alemanha, Áustria, Grécia, Macedónia do Norte e uma network europeia ligada à sustentabilidade sediada em França, a SDSN (Sustainable Development Solutions Network) – estão também a preparar estes cursos. No total, somos 16 parceiros de cinco países, a que se somam 40 parceiros associados com origem noutros seis países europeus.
A formação vai estar disponível em forma de cursos gratuitos, online, em formato de cursos iniciais, intermédios e avançados. Estamos numa fase muito ativa do projeto, pois os cursos terão de ser apresentados às empresas até final de 2024. Estamos a trabalhá-los na plataforma Moodle que vai estar conectada com o website do projeto.
Os cursos serão todos em inglês. Pondera-se também a possibilidade de cada país poder ministrar os cursos na sua língua para satisfazer as necessidades das empresas, especialmente das PME.
Sabemos já que as empresas do CENTIMFE vão ser as primeiras convidadas a usar essa oferta formativa na fase de avaliação, para que se façam depois as necessárias afinações. Quando o projeto terminar, vamos ter cursos síncronos ou assíncronos, feitos à medida do que serão as recomendações que possamos fazer no futuro. Outro objetivo do projeto é influenciar a adequação dos nossos currículos, de forma a que os alunos, quando saem da universidade, tenham as competências que o mercado procura.

Foi necessário fazer uma seleção prévia das temáticas em que os cursos iriam incidir?

Sim, isso já está feito. O projeto arrancou com cada país a fazer o levantamento das suas necessidades. Alocámos a elaboração dos cursos conforme as necessidades de cada país, as quais são muito diferentes. Mesmo a regulamentação a que cada curso obedece difere entre os países. Por exemplo, a Macedónia do Norte, não pertencendo à UE, não está obrigada a cumprir algumas diretivas europeias relativas à formação profissional. Já os alemães estão muito mais focados e desenvolvidos nos aspetos da economia circular, o que tem a ver com a sua própria indústria.
A ideia é, no fim deste Quadro Comunitário, cada país ter um Centro de Excelência Profissional que integrará uma rede europeia, que poderá vir a replicar-se na Europa a partir destes CATALYST – Centre for Sustainable Transformation.
Nós, em Portugal, estamos a pensar nisto numa perspetiva de futuro, para lá do fim do projeto.

Que especificidades tem esta formação que está a ser contruída?

Os cursos até 10 horas são básicos, completamente assíncronos, têm vídeos e textos. Os cursos intermédios são mais desenvolvidos, mas também são assíncronos, estão previstas até 20 horas. Os cursos avançados podem ir até às 30 horas, são mistos (têm componente assíncrona e síncrona). Alguns cursos têm associados recursos e serviços como mentoring ou consultadoria. Um dos cursos que temos é Intellectual Capital and Change Management for Digital Transformation and Sustainability. Haverá dias marcados para que o formador esteja online de forma síncrona, a dar feedback aos formandos. Estes cursos mistos são mais complexos, por isso também são uma minoria no projeto. Temos tópicos na área do Desenvolvimento Sustentável, da Transição Resiliente, da Gestão Sustentável dos Negócios, da Gestão do Capital Intelectual, Economia Circular, Transformação de Negócios, etc.

Este é um projeto de cinco países em parceria (mais um parceiro francês), liderado pela Macedónia do Norte. Como é que se deu o envolvimento do Iscte?

Os parceiros da Macedónia do Norte, o IECE – Institute for Research in Environment Civil Engeneering and Energy, pretendiam integrar a gestão do capital intelectual no projeto; sendo esta a minha área de especialização, contactaram comigo, e promoveram também o envolvimento da ICAA. Tenho vindo a constatar que países de fora da União Europeia são muito ativos a concorrer a projetos europeus.

O projeto termina em maio de 2026. O que está previsto ao nível de iniciativas de disseminação do projeto?

Temos muitas reuniões online, workshops até reuniões de equipa, reuniões de disseminação e comunicação. Muitas vezes criamos eventos de disseminação em que envolvemos outros stakeholders. Na fase de estruturação dos cursos, o Iscte está a liderar toda a formação sobre como se estrutura um curso assíncrono ou misto no Moodle: que módulos deve ter, como fazer um curso interativo, etc. Nós fazemos esse acompanhamento e vamos verificando se estão em conformidade com os padrões definidos. A fase de teste inicial decorre até setembro. Está a ser trabalhosa e muito desafiante. Todos os anos temos, pelo menos, uma grande reunião presencial com todos os parceiros. O arranque do projeto foi na Macedónia do Norte, em 2022. Em junho de 2023, assinalámos um ano de projeto aqui no Iscte. Vieram todos os parceiros para esse workshop que foi muito importante. Houve depois, nesse ano, mais dois workshops na Áustria, em Viena e em Graz. Em abril de 2024, o workshop foi na Grécia e, em novembro deste ano, será na Alemanha. O ano de 2025 será essencialmente para estar no terreno, a aplicar e testar os cursos nas empresas. Em 2026, terá lugar a reunião de encerramento do projeto, na Macedónia do Norte.

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